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A Caixa Beneficente da Polcia Militar (CBPM) uma autarquia vinculada Secretaria de Segurana Pblica, que tem como funo gerir o regime de Assistncia mdico/hospitalar e odontolgica (AMHO) dedicado aos familiares dos policiais militares contribuintes.
Atravs de convnio celebrado com a Associao Cruz Azul, a CBPM atravs da Lei Estadual n 452/1974, disponibiliza a prestao de servios de assistncia mdico/hospitalar e odontolgica mediante cobrana mensal de uma contribuio de 2% (dois por cento) sobre os vencimentos do servidor militar. Ocorre que, embora atualmente a legislao supramencionada disponha que a referida contribuio deva ser facultativa, na prtica a mesma tem sido efetuada de forma obrigatria a todos os policiais ativos e inativos ? tendo dependentes ou no, sem qualquer possibilidade de anuncia aos servios de assistncia mdico/hospitalar e odontolgica.
O artigo 5, II, da Constituio Federal de 1988 que abaixo transcreve, consagra que todos possuem liberdade para agir ou no agir, conforme sua necessidade, exceto quando uma lei legtima e constitucional determine uma proibio ou uma conduta impositiva ? princpio da legalidade.
O direito de associao possui um aspecto positivo que assegura a qualquer pessoa o direito de se associar e o aspecto negativo do direito de no se associar, sendo que lei alguma poder compelir algum a associar-se ou permanecer associado ? princpio da autonomia da manifestao de vontade, segundo o disposto no artigo 5, inciso XX, da Carta Magna, ?in verbis?:
- ?(...)
- Art. 5 Todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade, nos termos seguintes:
- (...)
- II - ningum ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa seno em virtude de lei;
- (...)
- XX ? ningum poder ser compelido a associar-se ou a permanecer associado?. (grifo nosso)
- (...)?
Assim sendo, no se discute aqui a inconstitucionalidade na instituio do regime de assistncia-mdica aos servidores pblicos, ocorre que a compulsoriedade da contribuio ilegal, uma vez que o servidor no anuiu para estar vinculado CBPM ou Associao Cruz Azul, forando todos, inclusive aqueles que no se valem do servio, a custear o sistema.
Dentro do sistema jurdico ptrio, no pode haver lei de nenhuma ordem que contrarie a Constituio Federal, por isso deve haver uma compatibilidade entre a Carta Magna e as leis infraconstitucionais.
O Supremo Tribunal Federal j se posicionou a respeito desse tema, defendendo a liberdade da pessoa de se associar ou no:
- Por no se confundir a associao de moradores com o condomnio disciplinado pela Lei 4.591/1964, descabe, a pretexto de evitar vantagem sem causa, impor mensalidade a morador ou a proprietrio de imvel que a ela no tenha aderido. Consideraes sobre o princpio da legalidade e da autonomia da manifestao de vontade ? art. 5, II e XX, da CF.? (RE 432.106, Rel. Min. Marco Aurlio, julgamento em 20-9-2011, Primeira Turma, DJE de 4-11-2011.)
- Art. 2, IV, a, b e c, da Lei 10.779/2003. Filiao colnia de pescadores para habilitao ao seguro-desemprego (...). Viola os princpios constitucionais da liberdade de associao (art. 5, XX) e da liberdade sindical (art. 8, V), ambos em sua dimenso negativa, a norma legal que condiciona, ainda que indiretamente, o recebimento do benefcio do seguro-desemprego filiao do interessado a colnia de pescadores de sua regio.? (ADI 3.464, Rel. Min. Menezes Direito, julgamento em 29-10- 2008, Plenrio, DJE de 6-3-2009.)
- CONTRIBUIO PARA O CUSTEIO DOS SERVIOS DE ASSISTNCIA MDICA, HOSPITALAR, ODONTOLGICA E FARMACUTICA. ART. 85 DA LEI COMPLEMENTAR N 62/2002, DO ESTADO DE MINAS GERAIS. NATUREZA TRIBUTRIA. COMPULSORIEDADE. DISTRIBUIO DE COMPETNCIAS TRIBUTRIAS. ROL TAXATIVO. INCOMPETNCIA DO ESTADO-MEMBRO. INCONSTITUCIONALIDADE. RECURSO EXTRAORDINRIO NO PROVIDO.
- I ? ntida a natureza tributria da contribuio instituda pelo art.85 da Lei Complementar n 64/2002, do Estado de Minas Gerais, haja vista a compulsoriedade de sua cobrana. II ? O art. 149, caput, da Constituio atribui Unio a competncia exclusiva para a instituio de contribuies sociais, de interveno no domnio econmico e de interesse das categorias profissionais e econmicas. Essa regra contempla duas excees, contidas no arts. 149, 1, e 149-A da Constituio. exceo desses dois casos, aos Estados membros no foi atribuda competncia para a instituio de contribuio, seja qual for a sua finalidade. III A competncia, privativa ou concorrente, para legislar sobre determinada matria no implica automaticamente a competncia para a instituio de tributos. Os entes federativos somente podem instituir os impostos e as contribuies que lhes foram expressamente outorgados pela Constituio. IV Os Estados-membros podem instituir apenas contribuio que tenha por finalidade o custeio do regime de previdncia de seus servidores. A expresso regime previdencirio no abrange a prestao de servios mdicos, hospitalares, odontolgicos e farmacuticos?.
- (RE 573.540, Rel. Min. Gilmar Mendes, Plenrio, DJe 11.6.2010).
O STF entendeu que o Estado pode instituir plano de sade para servidor, mas a adeso ou no ao plano no pode ser obrigatria.
A Constituio Federal, no artigo 149, pargrafo primeiro, prev que a instituio de contribuies valeria apenas para custeio do sistema de previdncia, excluindo o custeio de assistncia mdico-hospitalar e odontolgica.
- ?(...)
- Art. 149 - Compete exclusivamente Unio instituir contribuies sociais, de interveno no domnio econmico e de interesse das categorias profissionais ou econmicas, como instrumento de sua atuao nas respectivas reas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuzo do previsto no art. 195, 6, relativamente s contribuies a que alude o dispositivo.
- 1 - A Unio, os Estados, o Distrito Federal e os Municpios instituiro, por meio de lei, contribuies para custeio de regime prprio de previdncia social, cobradas dos servidores ativos, dos aposentados e dos pensionistas, que podero ter alquotas progressivas de acordo com o valor da base de contribuio ou dos proventos de aposentadoria e de penses.
- (...)?
A compulsoriedade da contribuio para regime de assistncia mdico/hospitalar e odontolgica imposta pela CBPM no foi contemplada pela Carta Maior, haja vista no estar prevista no referido artigo constitucional.
Conforme se pode observar abaixo, o Artigo 30 combinado com o inciso I do Artigo 32 e incisos I, II, III e IV do Artigo 6 da Lei Estadual n 452/1974 dispem que sero contribuintes obrigatrios da associao civil Cruz Azul de So Paulo os contribuintes obrigatrios da autarquia Caixa Beneficente da Polcia Militar do Estado de So Paulo para efeito de penso, ?in verbis?:
- ?(...)
- Artigo 6 - So contribuintes obrigatrios: (NR)
- I - os militares do servio ativo; (NR)
- II - os militares agregados ou licenciados; (NR)
- III - os militares da reserva remunerada ou reformados; (NR)
- IV - os pensionistas dos militares a que se referem os incisos I, II e III deste artigo. (NR)
- (...)
- Artigo 30 ? A assistncia mdico-hospitalar e odontolgica, aos beneficirios dos contribuintes da CBPM, ser prestada pela Cruz Azul de So Paulo, nos termos desta lei e em conformidade com convnio a ser firmado com essa entidade, no prazo de 30 (trinta) dias, contados a partir da data da vigncia desta mesma lei com a prvia aprovao do Secretrio da Segurana Pblica.
- 1 ? Do convnio a que alude este artigo dever constar clusula mediante a qual a CBPM se comprometa a contribuir, para a Cruz Azul de So Paulo, com importncia que compense a deficincia que se verificar entre o valor do produto da arrecadao da taxa a que se refere este artigo e o do custo da manuteno dos servios de assistncia prestada aos dependentes de seus contribuintes.
- (...)
- Artigo 31 - A taxa de contribuio para a assistncia mdico-hospitalar e odontolgica de 2% (dois por cento) da respectiva retribuio-base. (redao dada pela LC n 1013, de 06 de julho de 2007)
- 1 (...)
- 2 - As taxas de contribuio de que trata este artigo sero recolhidas diretamente CBPM, que as repassar, de imediato, Cruz Azul de So Paulo. (redao dada pela LC n 1013, de 06 de julho de 2007)
- (...)
- Artigo 32 ? So contribuintes obrigatrios:
- I ? os contribuintes inscritos, obrigatoriamente, para efeito de penso;
- (...)?
A Cruz Azul de So Paulo entidade beneficente, de natureza privada destinada prestao de servios mdicos e odontolgicos, que atende os beneficirios da Caixa Beneficente da Polcia Militar, por fora do convnio celebrado e qualquer contribuio para esse sistema deve ser facultativa.
Assim, verifica-se presente a violao aos princpios constitucionais da legalidade e da livre associao, previstos no artigo 5, II e XX, e no artigo 149, 1 da Constituio Federal, haja vista a inconstitucionalidade encontrada no artigo 6; no artigo 30, combinado com o inciso I do Artigo 32 e incisos I, II, III e IV todos da Lei Estadual n 452/1974, alm de nenhuma norma infraconstitucional poder impor a quem quer que seja, diretamente ou indiretamente, a condio de associado ou contribuinte de entidade privada prestadora de servios mdicos.
Alis, cumpre ressaltar que a sade um direito de todos (artigo 196, da Constituio Federal de 1988), tendo o servidor o direito de aderir a um plano de sade efetivamente colocado sua disposio, com a devida contribuio que deve ser sempre facultativa e no compulsria.
Dessa forma, caso voc servidor militar, esteja sofrendo os descontos compulsrios referente assistncia mdica da CBPM e decida cessar a referida contribuio em seus vencimentos, procure seu advogado de confiana a fim de promover o respectivo desligamento judicial junto a CBPM.
Dra. Daniela C. Legnare Duarte
Advogada - OAB/SP n 274.586
dra.daniela@legnareduarte.adv.br
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